Padre Djalma Lúcio Magalhães Tuniz
Pároco de Américo de Campos e Pontes Gestal
Há um silêncio nesta manhã. Os pássaros acordaram mais cedo como de costume, mas não fizeram algazarras. Seus cantos saíram abafados e tristes. O vento amainou e perdeu as forças. A chuva só ameaçou, mas não quis cair do céu, deixando a terra ainda mais sedenta. O sol, desmaiado e sem vida, clareava sem iluminar e, entre as nuvens, buscava se esconder, como se pedisse desculpas por não ter forças para enviar os seus melhores raios. Apenas o silêncio teimava em usar todas as suas forças e reinava em meio à desolação.
Muitas pessoas acordaram nesse dia, como acordam todos os dias. Mulheres varreram as calçadas, limpando as folhas secas que caíram ao longo da noite. As crianças acordaram mais tarde, aproveitando o feriado prolongado. Alguns viajaram e foram se divertir. Outros se ocuparam em nada fazer. Apenas esperando as horas passarem. Alguns trabalhos essenciais não pararam, e os trabalhadores acordaram para mais um dia comum de labuta de esforço.
Apenas os mais atentos perceberam o silêncio reinando mundo afora. Os de coração sensível e os de alma apurada sabiam que o dia estava diferente. Não havia cor. Não havia sons. Não havia vida. Apenas dor e sofrimento de uma mãe, carinhosamente chamada nesse dia de Senhora das Dores, encontrando o seu Filho amado na via tortuosa rumo ao Calvário.
Seria ela a causadora daquele silêncio todo? Ou a sua dor apenas era irradiada pela dor do seu Filho? O Homem das dores, carregando a cruz pesada do mundo inteiro. Era um sofrimento lancinante. Um rastro de sangue e suor deixado em cada passo lento e ofegante.
A dor era dele. “Não choreis por mim”, disse às mulheres que batiam no peito e choravam quando o viam. “Chorai por vós mesmas e pelos vossos filhos”, completou com a voz embargada e o coração dilacerado pelo peso que carregava em seus ombros.
Não queria que sofressem por ele. Ele é que sofria por nós. Pilatos até que tentou livrá-lo daquela tragédia. Disse ao ver Jesus sendo acusado pelo povo: “Não encontro nesse homem nenhum crime”. E realmente não havia.
Só se o crime fosse ter curado as feridas de tantos enfermos. Ter transformado água em vinho e trazido alegria a uma festa de casamento. Ter dado pão e peixe a uma multidão faminta. Talvez o crime fosse se abaixar ao lado de uma mulher pecadora e questionar aqueles homens, com pedra nas mãos: “Se alguém não tiver pecado, atire a primeira pedra”. Será que foi isso?
Um dia, passando pelos portões da cidade de Naim, Jesus encontrou uma viúva que levava o único filho para ser sepultado. Ao vê-la chorando, disse com a voz carregada de compaixão: “Mulher, não chores”. E fez voltar à vida o seu filho morto. Seria esse o crime que o levaria à morte? Curar o sofrimento das pessoas que cruzavam pelo seu caminho?
Deu água viva a quem tinha sede. Saciou com o pão do céu todos os que tinham fome. Abriu os olhos aos cegos. Fez os paralíticos andarem. Curou uma mulher que há doze anos sofria de uma hemorragia e trouxe novamente à vida a filha de Jairo, um chefe da sinagoga judaica. Seriam esses atos os responsáveis pela sua condenação?
Poucas horas antes de subir a estrada carregando a cruz, ele havia ceado com seus discípulos. Antes da ceia, pegou um jarro com água, cobriu-se com um avental e lavou os pés de todos eles. Um gesto inimaginável para aqueles homens incrédulos. Como pode o mestre lavar os pés dos discípulos? Pedro, horrorizado com tamanha ousadia, disse: “Os meus pés tu não lavarás”. Mas ouviu do Senhor que, se não deixasse lavar, não teria mais parte com ele. Assim foi convencido pelo mestre e aprendeu a lição que era preciso lavar os pés uns dos outros.
É verdade que ele foi ousado. Transgrediu algumas leis. Falou palavras duras. Mas também é verdadeiro que as crianças o adoravam e tinha amigos simples e sinceros que o recebiam em casa e passavam o dia conversando com muito pão, peixe e vinho. Era dado ao diálogo, defendia as viúvas, os órfãos e os estrangeiros e enfrentava os hipócritas da sua época.
Aqui talvez se encontre a razão da sua condenação. Como pode falar de amor em meio à guerra? Como se atrever a chamar Deus de Pai? Que loucura jantar com pecadores e deixar-se tocar pelos leprosos! Não deveria ter se exposto tanto.
Séculos depois, aqui estamos numa Sexta-Feira Santa refletindo sobre a sua vida, a sua morte e a sua ressurreição. O silêncio é necessário, porque não encontramos sentido em meio ao barulho que o mundo faz. Não percebemos uma brisa suave e mansa em meio à tempestade.
É preciso calar-se para ouvir o seu grito: “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes?”. Só silenciando o coração é que podemos nos aproximar da Cruz de Cristo e, com o olhar de ternura e o coração agradecido, presenciar o maior gesto de amor que a humanidade já recebeu nesse mundo: a morte de Jesus pela nossa salvação.
Se esse fato não nos comover mais, se não tivermos mais tempo de parar para refletirmos sobre o evento da Cruz de Cristo, talvez ainda seja preciso encontrarmos o verdadeiro sentido da nossa vida. Encontramos na Carta aos Hebreus: “Aproximemo-nos do trono da graça com toda a confiança, a fim de recebermos misericórdia e encontrarmos graça que nos ajude no momento da necessidade”.
Ainda há tempo de ver Jesus morrendo na Cruz e encher o coração de gratidão na aurora do Domingo da Ressureição. Acredite! Vive para sempre aquele que morreu por nossos pecados.