O caminho do meio

Padre Djalma Lúcio Magalhães Tuniz

Pároco de Américo de Campos e Pontes Gestal

 

Estamos vivendo um movimento de extremos. Na política, na economia, na religião, tudo é apresentado com dois polos bem claros e isso acaba tolhendo de maneira doentia a possibilidade de olhar o mundo com mais leveza, sobre outros prismas. É preciso lembrar que para tudo há uma solução. Não se pode querer que o mundo caminhe através de uma só ótica. Você faz o seu caminho, apresenta a sua verdade, e o outro decide se quer caminhar com você ou não.

Só não há negociação para o pecado, pois agride a razão humana e viola a Lei do Amor dada por Deus. Mas, mesmo diante do pecado, se pode pedir a misericórdia divina. É interessante observar que, apesar do pecado, Deus se faz misericórdia, pedindo apenas que o pecador perdoado vá embora e não peque mais.

Não podemos sentir orgulho pelos erros que cometemos. Somos falhos e vivemos em construção de nós mesmos a todo instante. Às vezes, achamos que estamos concluídos, obra terminada, sem necessidade de reparos. Outras vezes, nos damos conta de que é preciso refazer tudo, recomeçar, mudar alguns pensamentos ou hábitos. A isso damos o nome de maturidade.

Ser maduro na fé é crer que somos o que somos pela graça de Deus, como nos ensina o apóstolo Paulo. Dependemos dessa graça para nos libertar das amarras do mal, que destrói a nossa vida e deturpa os planos de Deus para nós.

Mas, para se tornar uma pessoa madura, exigem-se muitos caminhos percorridos, experiências frustradas, decepções vividas. Não se faz uma obra sem preocupação e tempo dedicado. Não se amadurece sem arriscar a viver com intensidade o que a vida apresentar. Somos seres inacabados e, por isso mesmo, sujeitos a ensinar e aprender a todo instante. Não se amadurece escondido numa casa sem janelas e portas abertas para o outro.

Os extremos podem nos fazer fechados e intolerantes. A pior coisa é quando encontramos uma pessoa fechada em suas próprias verdades, ainda mais quando se está ligado a uma religião. É incapaz de entender o próprio Evangelho de Jesus. Não consegue fazer a leitura através da misericórdia e muito menos do amor. Continua eternamente na visão do “olho por olho e dente por dente”, trancando assim todas as possibilidades de quebrar as correntes do ódio. Ou pensa como eu ou é meu inimigo. E, vamos ser sinceros, nem todo mundo quer ser nosso inimigo. Querem apenas ser eles mesmos.

É por essa razão que todos os extremos são burros.  Há uma leviandade em querer vencer pela força da palavra ou da ideologia. Por ser mais fácil esse caminho, abre-se mão do diálogo, do respeito e, acima de tudo, do poder curativo do amor. Por isso mesmo, ao escolher o “caminho do meio”, que para mim sempre se remonta à busca do equilíbrio, enveredamos para um mundo mais humano. Somos diferentes, pensamos diferentes, mas, ao mesmo tempo, feitos da mesma matéria e predestinados ao mesmo fim nesse mundo: a morte. Por isso é tão importante parar e refazer o caminho, quando necessário.

Um dia, Jesus percebeu que seus discípulos estavam exaustos. Disse: “Vinde sozinhos para um lugar deserto, e descansai um pouco”. Ele também precisava de calmaria. Eram muitos os que buscavam tocá-lo, pois precisavam de atenção. As pessoas sentem necessidade de serem ouvidas, abençoadas, perdoadas, alimentadas, curadas. Mas, chega um momento em que aquele que deveria curar sente-se ferido, cansado. É bom saber que Deus também precisa de silêncio, calma, repouso.

O meio termo, às vezes, nos leva a enxergar pelos olhos do amor. Ficamos mais próximos do projeto de Deus para nós. Há uma busca pela santidade, mas há também uma paciência evangélica para com aqueles que estão ao nosso redor e que necessitam de um tempo maior para compreender os mistérios divinos. É preciso seriedade e responsabilidade nas escolhas, mas é preciso também um querer estar junto com aquele que escolheu um caminho diferente.

Quando necessário, fale das suas escolhas e como isso mudou a sua vida, mas sempre, em todo o momento, viva intensamente essas escolhas que você fez, apresentando ao outro o quanto feliz você é por ter se deixado transformar pela graça de Deus.

O mundo polarizado só nos divide. Somos rotulados a todos os momentos, mas nunca amados e conhecidos com profundidade. Acabamos nos tornando um partido, uma igreja, uma cultura, esquecendo-nos que somos muito mais do que isso. Somos um ser que é feliz, pensa, sonha, trabalha, sofre e se reconhece dependente dos outros e, acima de tudo, do Outro, que é o próprio Deus.

O “caminho do meio” existe para pôr em prática a radicalidade do evangelho. Amar o pecador e não o pecado que ele carrega. Acolher o diferente sem querer que ele pense como você. Viver profundamente a máxima de Jesus: “Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”.