A vida como ela é

Padre Djalma Lúcio Magalhães Tuniz

Pároco de Américo de Campos e Pontes Gestal

 

 

Não é preciso ir muito longe para descobrir que, apesar da fragilidade humana, há muita esperança entre nós. Trago a você três relatos, vividos nesses dias de muito sol e pouca chuva, que demonstram a vida como ela é.

Pegou minha mão e agradeceu a visita. Evitava conversar, pois o médico recomendou que não tivesse muita agitação e nem emoções fortes. A minha presença ali era para rezar pela sua recuperação e ungi-lo com o óleo do Sacramento dos Enfermos. Fechou os olhos no momento da unção e uma pequena lágrima desceu lentamente pelo seu rosto magro. A vida não tinha sido fácil para ele. Mas enfrentou cada obstáculo e, na simplicidade, venceu todas. Essa última batalha é que estava sendo difícil. A doença não veio para brincar.

Fez todos os tratamentos que os médicos prescreveram. Tomou todos os remédios, passou pelas mãos de vários especialistas e, agora, é esperar a reação do seu organismo. Quanto à alma, estava fortalecida. Aprendeu com a mãe a rezar o terço e, nessa altura da sua vida, retomou essa prática que lhe tem ajudado muito. Consegue ouvir a voz da mãe, que já faleceu há muito tempo, rezando com ele, como no tempo da infância. E isso o conforta. Fui embora, levando no coração a imagem do terço pendurado na cabeceira da sua cama. Naquela noite rezei, pedindo a Deus que o terço seja também a minha oração no final da vida. E, pegando meu rosário nas mãos, rezei pela recuperação daquele homem.

Semana passada, fui ungir uma pessoa muito querida da nossa paroquia e que está internada. Ao entrar no hospital, fiquei pensando na alegria e na satisfação em conhecer um ser humano de bem com a vida, como ele é. Nossas conversas sempre acabavam em risadas. Menos na última em que disse que precisaria mesmo passar por uma cirurgia e estava só esperando os médicos agendarem. Quando foi hospitalizado, falávamos pelo whatsapp, e eu sempre dizia que estaria rezando pela sua recuperação e pelo seu retorno em breve para casa. Já faz vinte dias da cirurgia e continua na UTI inconsciente, lutando pela vida. Os médicos estão fazendo de tudo para trazê-lo de volta e, nós, juntos com a sua família, colocamos diariamente no coração de Deus o pedido pela sua recuperação.

Ao entrar na UTI, lavei as mãos com cuidado e fui até o seu leito. Ele não podia falar, ainda estava entubado, mas falei ao seu ouvido o quanto ele é querido, como está fazendo falta em nossa comunidade, como todos estão rezando por ele. Fiz a unção, rezei, abençoei e voltei para casa. Avisei sua filha que havia estado com o seu pai no hospital. Acredito na sua recuperação e no seu retorno entre nós. Há uma esperança coletiva aqui na cidade. Com todos que converso, sinto a mesma vontade de vê-lo novamente com seu carro de som, comunicando os fatos importantes da cidade.

Um dia, ele passou com o seu carro anunciando alguma promoção do supermercado, e eu rapidamente o convidei para um café. Parou, desceu do carro, tomou o café, rimos das conversas engraçadas que falava e voltou para o seu trabalho. Acho que todos nós estamos sentindo mesmo é saudade dele. Sua família sofre com essa luta pela recuperação, e estamos juntos nesse sofrimento. Deus é bom, logo poderá contar para nós tudo o que sentiu nessas semanas de internação e poderemos voltar a sorrir com ele.

Há mais de dois anos tenho acompanhado uma senhora que descobriu um câncer e iniciou um tratamento demorado e dolorido. Ela me procurou no atendimento e, chorando, contou-me do seu drama. Quantos sentimentos podem passar pelo coração de uma pessoa assim. Desde o medo de enfrentar a doença até a revolta por estar nessa condição. “Por que eu?”, perguntava com a voz embargada. Eu não sabia a resposta. Apenas a ouvia com atenção e buscava falar o mínimo possível, afinal, era ela que deveria transbordar o sofrimento para aliviar o coração.

Durante esse período nos encontramos diversas vezes. Sempre atento à evolução do seu tratamento, que em alguns momentos avançava para a cura e em outros estacionava, dando a sensação de que a luta estava sendo em vão. Neste caso, eu sempre aconselhava a fazer tudo o que os médicos indicavam. E ela, às vezes desanimada, colocava todas as suas forças nesse conselho, e sempre voltava a alimentar a esperança nos bons resultados do tratamento.

Hoje, recebi um áudio que me alegrou muito e me deixou emocionado. O esposo, sempre dedicado e cuidadoso com ela, disse que estão nas etapas finais do tratamento ostensivo e está indo muito bem. “Estamos no quarto do hospital sem sair, isolados há mais de quinze dias. Mas quero agradecer a sua presença desde o primeiro instante em que a doença se manifestou. Em breve, se Deus quiser, estaremos de volta para casa”.

A vida realmente não é tão fácil assim. Se as pessoas soubessem como é importante essa solidariedade entre nós, deixariam de se preocupar com tantas coisas sem importância e dariam mais atenção àquilo que realmente importa: “amar sem medidas”.

Jesus diz que o importante é o que sai do coração humano e não o que entra. Cuidemos mais do nosso interior, dos nossos pensamentos, da nossa fé. Só assim seremos melhores, poderemos olhar ao redor e ver que há muitas pessoas precisando do nosso abraço, da nossa presença ou, simplesmente, do nosso olhar de compaixão.