Tome a sua Cruz

Padre Djalma Lúcio Magalhães Tuniz

Pároco de Américo de Campos e Pontes Gestal

 

Estava já na porta da igreja, depois da missa, e ela veio me procurar. Deu-me um abraço e disse: “Padre, a missa foi tão linda que me deu até vontade de chorar”. Retribuí o abraço, agradeci e fui embora, pensando o que realmente toca a nossa alma nos dias de hoje. Já sabemos que somos muito mais do que percebemos do mundo e de nós mesmos. Trazemos em nossa existência um grande mistério que sempre está pronto a ser desvendado, mas, por diversos motivos, acaba escondido em meio a tantas preocupações, que, muitas vezes, não descobrimos o verdadeiro sentido da vida.

Quando conseguimos furar essa bolha que envolve a nossa existência cotidiana, encontramos o que realmente é importante: a beleza em estar vivo e o Sagrado que nos envolve. Só assim consigo explicar essa vontade de chorar que ela me confidenciou depois da missa. Não é tristeza, mas alegria. Alegria em perceber que, apesar das dores e sofrimentos da vida, há algo realmente belo e superior que rege tudo e que dá a cada um de nós a garantia de que não estamos sós, pois fazemos parte de um grande projeto de amor que está aí, bem ao nosso alcance.

É por isso que a religião deve ser para nós um elo entre a humanidade e Deus. Tem a função de religar os corações humanos, muitas vezes dilacerados pelas dificuldades da vida, ao Coração de Deus, que ama, espera, perdoa e acolhe a todos. Quando percebemos a grandeza desse amor Sagrado, sentimos uma alegria interna. São Francisco chama isso de “Perfeita Alegria”, que é quando você consegue ligar esse grandioso movimento de Deus em sua pequena existência.

A doença pode estar atrapalhando tudo, a morte de alguém querido pode ter chegado e apertado o coração de saudade e luto, a família pode não estar unida como deveria, a situação financeira ainda não está do jeito certo, mas há um sentido profundo e maravilhoso em estar vivo.

Esses dias, fui tomar café na padaria depois de rezar o terço com quase uma centena de homens que, todos os sábados bem de manhãzinha, encontram-se para a oração na igreja, e um senhor se aproximou, segurou com força o meu braço e disse: “Padre, minha esposa começará o tratamento de câncer. Poxa, eu anda nem terminei o meu, está quase no fim. Podia ter esperado um pouquinho um se restabelecer para começar o outro”. Nessa situação, com mais vontade ainda, é preciso buscar na fé forças e sentido para continuar lutando.

Viver é combate constante. Mas, viver é bom. A vida só tem sentido quando se tem coragem para enfrentar as dificuldades e certeza de que vale a pena enfrentar todos os medos. Afinal, a religião cristã nos ensina que temos um Deus que sofre conosco. Nunca desiste em nos ajudar na travessia da vida. Disse Jesus um dia: “Se você quiser me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me”.

Essa questão de renunciar a si mesmo não é renunciar à sua essência, à sua alegria, à busca pela felicidade. Não. É renunciar à teimosia em querer sempre se dar bem em tudo. É saber que nem tudo o que quero eu posso conseguir. É descobrir que nesse mundo tudo é passageiro e, por isso mesmo, não devo me apegar tanto. O verdadeiro sentido está em buscar aquilo que não passa. É saber que até a dor pode nos ensinar sobre as coisas boas e verdadeiras que devemos buscar. Renunciar a si mesmo é, antes de tudo, colocar a vontade de Deus em primeiro lugar.

O que muitas vezes nos confunde nessa busca pela vontade de Deus é pensar que, estando perto d’Ele ou sendo fiel aos seus ensinamentos, a vida será mais fácil, não teremos aborrecimentos e nem tropeços. Tudo será como determinamos e o mal não tocará a nossa existência. Mas, não devemos esquecer que a fé deve nos levar a assumir as nossas próprias cruzes. “Tome a sua cruz”, disse o Senhor, colocando essa atitude intimamente ligada ao seu seguimento.

Quando alguém vem até mim e diz que sentiu vontade de chorar de alegria na missa ou que precisa de forças para enfrentar a doença ou ainda que esteja perdida, pois morreu alguém muito próximo e não sabe como lidar com essa dor, tenho vontade de abraçar e dizer: “Deus continua amando você profundamente. Tenha força. Não se desespere. Enfrente as dificuldades um pouco de cada vez e caminhe devagar, tudo vai se acomodar”.

O grande milagre é manter-se vivo e bem. A qualquer momento tudo pode sair do controle e, quando isso acontecer, é preciso colocar os dois pés no caminho da fé, e o coração ficar na mesma frequência dos batimentos do Coração de Jesus. Existem momentos em nossa vida que só Deus pode nos consolar e nos ajudar a retomar o equilíbrio que precisamos.

Por isso é tão importante descobrir o caminho da igreja. Não se deixe enganar por falsos profetas que prometem alegrias materiais e ausência de sofrimentos. Isso não é bíblico. A vida é feita de esforço e de muita fé em Deus. É possível encontrar uma alegria profunda em nossa alma, desde que estejamos conectados aos ensinamentos do evangelho e que busquemos o bem de maneira sincera e intensa. Deus é bom o tempo todo.