O Perdão

Não é fácil perdoar. Principalmente quando você está com a razão em se sentir ferido com a atitude do outro. Se fosse tão fácil assim, Jesus não teria dito que “é preciso perdoar até setenta vezes sete”. Bastaria uma vez e pronto, tudo se resolveria. Mas não é assim. É preciso lutar contra o orgulho que impera em nosso coração e não nos deixa sossegados até ver o outro na mesma situação em que ele nos deixou. Faz com que o “olho por olho” e o “dente por dente” sejam o único jeito de resolver o desentendimento pelo qual está passando.

Perdoar é um dom. E como todo dom, uns tem mais e outros menos. Aos que possuem a facilidade do perdão, não se esqueçam de agradecer a Deus por essa dádiva. Nunca irão entender o que é guardar um rancor por anos a fio. Carregar o fantasma da dor de ter sido magoado ou insultado por alguém. Não saberão o que é dormir pensando nisso e, ao acordar, o mesmo pensamento vem à tona, pautando assim todo o nosso dia.

Pode até ser reconfortante no início querer revidar, torcer para que aconteça algo ruim na vida do outro, arquitetar para que sofra o mesmo que você está sofrendo. É bom ver o inimigo se dar mal. Parece até prazeroso. Sentimos que fomos desafrontados.

Mas, com o passar do tempo, isso também vai cansando. Percebemos que fez mais mal para nós do que para o outro. A dor se transformou em doença física, minou nossa capacidade de sermos livres e leves em nossos pensamentos, calou nossas canções e cerrou nossos lábios para os sorrisos.

Ainda mais quando descobrimos que o outro, aquele que nos fez mal, nem se recorda mais do que fez. Continuou a sua vida como se nada tivesse acontecido. E constatamos que o único que ainda alimenta a cólera e a repulsa somos nós mesmos. Dói demais saber que carregamos esse sofrimento sozinhos.

Para aqueles que não perdoam com facilidade, o caminho é esforçar-se. Se tiver amor à pessoa que lhe fez mal, talvez fique mais fácil. Continuará sofrendo por um tempo, mas a razão fala mais alto que a emoção e, com o passar dos dias, vai tentando refletir sobre o que aconteceu, promove um diálogo com o outro, tenta encontrar um caminho de paz, reconstituir a confiança e começar de novo.

Há muitos anos uma senhora idosa, já chegando ao final da vida, veio partilhar comigo o seu sofrimento no casamento. O marido, já idoso como ela, sempre a tratou mal, com grosseria, violência verbal e falta de respeito. Nem os filhos aguentaram essa situação. Quando puderem, saíram de casa e foram viver as suas vidas, longe do pai.

Quando vinham visitar a mãe, falavam que, quando a situação melhorasse, iriam levá-la para morar com eles. Um dia, a situação melhorou. O filho mais velho veio buscar a mãe, mas ela não quis ir. Decidiu continuar naquela vida e não abandonar o seu esposo.

Perguntei a ela porque tomou essa decisão depois de tantos anos nessa situação. Ela, com seu jeito simples, disse: “Padre, esse homem não consegue nem tomar os seus remédios sozinho. Se eu for embora, quem é que vai ajudar a tomar os remédios? Nessa altura das nossas vidas não posso abandoná-lo. Ele precisa de mim”.

Esse é um amor altruísta. Apenas ama e cuida. O altruísmo é um dos mais notáveis sentimento. A pessoa que busca e desenvolve essa prática se doa para o próximo sem esperar nada em troca. Faz isso naturalmente, não é forçado e muito menos obrigado. Não espera por recompensas e não se queixa por aquilo que faz. Muitos podem achar um absurdo esse comportamento. Confesso que eu também me coloquei no lugar dela e não sei se teria a coragem de continuar ali. Mas ela via nisso tudo um sentido e, quando ninguém mais queria a companhia daquele homem, ela se fez próxima e decidiu cuidar dele.

Falar do perdão passa um pouco por esse caminho. Perdoar não é esquecer o que o outro fez para você. Perdoar é fazer com que aquele fato pare de doer na alma. Aos poucos os sentimentos ruins vão se amainando até cessar. Perdoar é ter a capacidade de lembrar tudo o que aconteceu, mas sem o sentimento de raiva e de tristeza. Pode até ser que a confiança demore um pouco a voltar como antes. Muitas vezes nem volta mais a confiar no outro. Mas não deseja mal àquela pessoa. Segue a vida.

Parece até brincadeira falar sobre isso no mundo de hoje tão acostumado a confusões nos relacionamentos e nas instituições. Cada um procura vencer através do grito. Ganha quem pode mais, e quando não pode, dá-se um jeito de acabar com o outro. Resolve-se tudo na violência e na má educação. Falta respeito e amabilidade entre nós.

O segredo é amar como Jesus amou. E se você tiver dúvidas de como era esse amor, lembre-se d’Ele morrendo na Cruz, quando olhou para os soldados que ali estavam zombando da sua dor, e disse: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.

Muitos, ainda hoje, não estão sabendo como proceder diante dos conflitos. Tomara que nós façamos diferente: Agir mais como Jesus, e deixar o amor falar mais alto.

Padre Djalma Lúcio Magalhães Tuniz
Pároco de Américo de Campos e Pontes Gestal