O anjo Gabriel ficou em silêncio esperando a resposta da jovem que, com o olhar assustado, ainda não acreditava no que estava acontecendo. Ela havia acordado cedo naquele dia. Depois de fazer os afazeres de casa, bebeu um copo de água e pegou os seus bordados para terminar um trabalho que havia começado a pedido de sua mãe. Estava só em casa, distraída entre as linhas e os tecidos, apenas cumpria com os seus deveres. Mas, de repente, percebeu que não estava mais só.
Não teve tempo de pensar muito na cena que se apresentava diante dos seus olhos. Já ouvira falar dos anjos, mas assim, diante de si, nunca imaginaria que veria um. Ele se aproximou sem alarde, timidamente, como se precisasse pedir licença para estar ali e desculpas por vir sem avisar. Foi gentil e muito direto.
“Alegra-te, cheia de graça, o Senhor está contigo!”, disse com voz firme. A menina ficou perturbada. Seria um sonho? Uma distração mais profunda dos seus pensamentos joviais? Mas era real o que estava acontecendo. Podia apreciar o perfume que exalava do anjo, e que um dia também sentiu no Templo, quando o levita passou com uma vasilha cheia de brasas e incenso, enquanto caminhava rumo ao Santo dos Santos.
A presença de Deus em nossas vidas, muitas vezes, também pode acontecer assim, de maneira mansa e suave. Sem esperarmos, o sagrado toca a nossa existência e se faz presente em nosso cotidiano. É muito bom saber que não precisamos de muita coisa para sermos visitado pelo nosso Deus. É importante também sabermos diferenciar o extraordinário em meio ao ordinário. Sabermos o que é do céu e o que é da terra. Darmos importância aos pequenos detalhes preparados por Deus e que, na maioria das vezes, quando não estamos atentos, passam desapercebidos.
Mas, no caso do anjo com a jovem, não teria como não perceber. Um comunicado importante foi dado pelo mensageiro celeste, um presente de Deus para a humanidade, e para toda a sua criação: “Eis que conceberás e darás à luz um filho, a quem porás o nome de Jesus”.
Há alguns séculos, Isaías, um velho profeta, disse que “um filho nos seria dado e o seu nome seria Emanuel”. O povo, que andava na escuridão dos corações, alegrou-se com a notícia e ficou esperando ansiosamente a realização dessa profecia. O nome Emanuel quer dizer “Deus conosco”. Aqueles que achavam que Deus havia se esquecido deles voltaram a acreditar na possibilidade de ter um Deus próximo, que sofreria as suas dores e se alegraria com suas alegrias. Mas que, no final de tudo, abriria novamente o caminho do Paraíso que haviam perdido pela falta de atenção e compromisso com o seu Criador.
O “Deus conosco” demorou ainda alguns séculos para chegar, mas chegou. O anúncio do anjo à jovem Maria trouxe-nos novamente a mesma sensação do povo antigo que esperava o Emanuel. Só que agora o nome sugerido pelo anjo era Jesus.
De um “Deus próximo”, como disse o profeta, veio para nós o “Deus Salvador”, o que traz a salvação para o seu povo. Esse é o significado do nome Jesus. Como entender esse mistério de amor que é o nosso Deus? Ele conhece profundamente o coração humano, sabe das nossas fraquezas, como podemos ser maus e cruéis. Sabe que não somos fiéis e que o egoísmo está entranhado em nossos sentimentos. Não conseguimos levar por muito tempo a nossa vida sem cometer erros. O Senhor sabe que o pecado fez morada em nós, e, mesmo assim, decide caminhar ao nosso lado e nos salvar da morte.
A humanidade recebeu o maior de todos os presentes que poderia receber. Se antes achávamos que a vida era um presente maravilhoso, hoje, descobrimos que a vinda de Jesus ao nosso meio é que tornou a vida maravilhosa. Sem Ele não conseguimos alcançar a plenitude de estarmos vivos. Sem Ele os sentidos ficam confusos e os caminhos tortuosos. Sem Ele o amor acaba e a paz não se estabelece.
É por isso que o anjo Gabriel ficou em silêncio, esperando a resposta daquela jovenzinha de Nazaré. Ele sabia da responsabilidade da proposta que o Senhor lhe havia feito: “Aceita ser a mãe do Salvador?”. Sabia de todas as consequências que esse gesto de amor teria, afinal, quem ama sabe: “amar dói”. E Deus quis sofrer por amor.
Ela, olhando fixamente nos olhos do anjo, disse a sua decisão: “Eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra”. O anjo retirou-se apressadamente, levando a resposta a Deus que começou os preparativos para o envio do Filho Salvador, que, séculos depois de Isaías, cumpriria a profecia de ser Deus conosco.
E assim aconteceu o Natal de Jesus. Um misto de desejo de Deus e o sim da humanidade. A fusão do Criador com a criatura. O céu e a terra unidos num só desejo: “ver finalmente acontecer a paz entre os homens”.
Por isso, não há sentido festejar o Natal sem conhecer essa história e se maravilhar com ela. Deus, que sempre cuidou da sua criatura, chega nesse mundo em forma de um bebê frágil e pequeno, pedindo cuidados e atenção. Afinal de contas, amar também é ter cuidado mútuo. Ame e será amado. Respeite e será respeitado. Seja próximo e nunca se sentirá sozinho.
Não façamos muito barulho na noite de Natal, afinal, há um bebê que acabou de nascer e precisa dormir. Feliz Natal!
Padre Djalma Lúcio Magalhães Tuniz
Pároco de Américo de Campos e Pontes Gestal