Coração, alma e entendimento

Ficar na porta da igreja, recebendo os fiéis que chegam para a missa, é uma alegria para mim. Dá tempo de cumprimentar alguns, abraçar outros, saber de notícias, dar bênçãos aos que pedem e, mesmo que esse momento seja muito rápido, dá para perceber, pela expressão do rosto, como a pessoa está chegando para a eucaristia. Há os que chegam com um sorriso contagiante e logo se vê que a vida, apesar das dificuldades, está sendo vivida com leveza. Há os que não conseguem esconder a tristeza ou a preocupação, e estão chegando em busca de consolo e alívio para as suas dores.

Nesse domingo, tudo corria muito bem na acolhida até que, de repente, uma garotinha se aproximou de mim apressadamente. Trazia nas mãos um celular com a foto do pai deitado num leito de hospital, ligado a aparelhos. Em meio a lágrimas, pediu-me que rezasse por ele. Confesso que não entendi de início. Não estava conseguindo perceber quem era e o que pedia. Até que compreendi que ali estava uma criança que veio à missa pedir pelo seu pai que estava muito doente no hospital.

Ela devia ter uns dez anos de idade. Fiquei comovido com o pedido que me fez. Olhei com os olhos de compaixão, como ensina Jesus, sentindo a dor que ela trazia na alma, e, durante a missa, rezei por aquele homem, pedi para que a comunidade reunida orasse comigo por todos os enfermos.

A fé nos ajuda a encontrar sentido até nos momentos mais difíceis da vida. A dor, mesmo que cruel, abre espaço para esperança que nunca decepciona. E, muitas vezes, não há outro caminho senão buscar a Deus de todo o coração, de toda a alma e de todo o entendimento.

Aliás, esse foi justamente o evangelho daquele domingo. Alguns fariseus, querendo colocar Jesus à prova, perguntaram-lhe qual era o maior dos mandamentos. Sabemos que todos os mandamentos da Lei de Deus são importantes e merecem a atenção devida, e precisam ser colocados em prática. O que realmente os fariseus queriam ver era se Jesus iria priorizar algum mandamento e desprezar outro, infringindo assim a Lei e caindo na armadilha que eles prepararam.

Mas Jesus, com clareza e ao mesmo tempo muita profundidade, disse: “Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento”. A menina que me abordou na porta da igreja estava buscando a Deus de todo o seu coração. Sabia, a pequena, que não tinha outro lugar para colocar o seu pai, naquele momento, senão no coração de Deus. E, com lágrimas, pediu que rezasse por ele.

Lembrei-me de uma mulher que, um dia, entrou na casa onde Jesus estava jantando e, mesmo sem ter sido convidada, aproximou-se e derramou, em sua cabeça, todo o perfume que trouxera, lavou os seus pés com suas lágrimas e depois os enxugou com os seus cabelos.

A fé nos ajuda a entender que este mundo não tem respostas para todas as nossas dúvidas. Chega uma hora que precisamos nos curvar diante de Deus e, amando-o de todo o coração, pedir que cure as nossas dores.

Mas não podemos esquecer que é preciso uma intimidade construída ao longo dos anos. É preciso também amá-lo de toda a alma e de todo o entendimento. É preciso começar cedo a trilhar os caminhos do Senhor. A fé é fruto de uma escolha de vida, que, com o passar dos anos, vai se fortalecendo e nos dando a certeza de que o Senhor está sempre ao nosso lado.

Por isso, rezar é importante. Tanto as orações pessoais, escondidos em nosso quarto, com a porta fechada e o joelho no chão, como as orações comunitárias, quando nos encontramos com os irmãos nas missas, nos terços em família, nas novenas. Sabemos que também ali está Jesus. “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali estou no meio deles”, encontramos no evangelho de Mateus.

É preciso ainda ter uma fé inteligente. A fé nunca anula a razão, pelo contrário, faz com que os nossos pensamentos fiquem mais atentos ao movimento do sagrado em nossas vidas. Leva-nos ainda a buscar mais conhecimento sobre a Palavra, sobre a Doutrina Católica, sobre o Magistério da Igreja. Um católico que não aprofunda a sua fé, não consegue amar a Deus de todo o entendimento.

Fiquei sabendo que o pai daquela garotinha saiu do hospital dias atrás. Parece que está melhor, recuperando a saúde. Ele ainda não sabe, mas vou me encontrar com ele em breve. Quero contar-lhe sobre a sua filha. Falar que ela estava na missa com o celular na mão, e com a foto dele, rezando. Quero dizer-lhe que, através dela, eu também rezei por ele, assim como toda a nossa comunidade.

Não sei se conseguirá entender o poder da oração e de como as portas do céu se abriram naquela missa para ele. Mas terei a oportunidade de dizer-lhe que concretamente o evangelho daquele domingo foi colocado à prova e sua filha me fez perceber que há momentos em que só o amor de Deus, de todo o coração, de toda a alma e de todo o entendimento, pode fazer milagres aqui na terra.

Padre Djalma Lúcio Magalhães Tuniz
Pároco de Américo de Campos e Pontes Gestal