A missa de domingo

Padre Djalma Lúcio Magalhães Tuniz

Pároco de Américo de Campos e Pontes Gestal

 

Hoje o sol resolveu não dar o ar da graça. Dormiu até mais tarde e, quando despertou, vestiu-se apenas de claridade, deixando os seus raios quentes descansando no guarda-roupa. Com isso, as nuvens tomaram conta do céu. Indecisas e agitadas, às vezes deixavam cair um pouco de chuva fina, outras vezes só deixavam o dia meio pálido e sem graça. Nesse clima meio bobo, fui apressado para a igreja celebrar a missa. Afinal, hoje é domingo, dia do Senhor.

Carrega certo encantamento a missa dominical. Mesmo com o sol escondido entre as nuvens, um bando de passarinhos agitava a praça da matriz, com uma algazarra que só quem está de bem com a vida pode acordar com tamanha alegria. Eu, tentando acordar a alma, que ainda insistia em continuar na cama, olhava para o alto procurando carregar as minhas energias com os gritos dos pássaros. E, confesso, não deu muito certo. Ainda tinha a alma entre nuvens e precisava de um pouco mais de tempo para iluminar todo o meu ser.

A missa começou. Um canto bonito foi entoado e toda a igreja foi se iluminando pela presença de anjos celestiais, que, mesmo invisíveis aos nossos olhos, ocupavam os espaços entre os fiéis que, como eu, foram bem cedo celebrar a eucaristia.

Logo no início pedimos perdão a Deus pelas nossas incoerências, pois vivemos diariamente pressionados pelo busca da santidade e pelo erro do pecado. Sempre recordo São Paulo, que diz: “Não faço o bem que eu quero, mas pratico o mal que eu não quero”. É esse o nosso problema. Mesmo não querendo, deixamos o mal falar mais alto.

Logo após esse momento de ato penitencial, cantamos o “Glória a Deus nas alturas”. Como é bom glorificar a Deus, pedindo paz na terra às pessoas de boa vontade. Livre arbítrio. É isso que precisamos entender. A vida é feita de escolhas, de vontade de fazer o bem e devemos nos responsabilizar pelas escolhas que fazemos. É preciso buscar o sentido amplo da liberdade em nós. Sem ela, não somos quem deveríamos ser. Se não formos livres, nunca seremos donos de nós mesmos.

Ser livre para escolher um caminho religioso. Pertencer a uma Igreja. Fazer parte de um povo. Ser cristão. Não se deve buscar a Deus apenas por medo ou obrigação. Isso não faz bem. A busca pelo Sagrado deve ser feita pela convicção de que só viver não basta. É preciso avistar o eterno em nós e descobrir que tudo passa, mas nós não. Não passamos, apenas amadurecemos o que já está em nós em potência. Como uma roseira que, ao explodir um pequeno botão, já sabe que daqui a pouco terá uma bela, colorida e perfumada flor. Mesmo que ainda só vejamos apenas o botão fechado.

Assim somos nós, um botão esperando o dia de florescer. Carregamos a bondade, a beleza, a alegria, a paz. Temos em nós a maravilhosa capacidade de sermos muito mais do que pensamos ser. Há esperança correndo em nossas veias.

A missa já vai adiantada. Eu, mais desperto que a turba de passarinhos no lado de fora da igreja, já não me incomodo mais com o sol que, ainda sonolento, teima em não aparecer. Agora, a Palavra já está proclamada. Jesus ressuscitado aparece no meio dos discípulos incrédulos e diz em alto e bom som: “A paz esteja com vocês!”.

É essa paz que eu procuro. A que não depende da vida exterior, mas sim da vida interior com Deus. É acomodar dentro de mim tudo o que se tem de mais sagrado nesse mundo: a certeza de que não sou daqui. Pertenço ao Céu. É lá que meu coração bate mais forte. É onde a liberdade se torna plena, pois sei porque existo e para onde os meus dias me encaminham.

Perdão, liberdade, paz. Para que sol se somos iluminados pelas certezas sagradas da fé? A missa segue o seu rito e nesse “senta e levanta”, canta-se e reza-se a vida em plenitude que Jesus veio oferecer. O momento da Eucaristia se aproxima. O pão já não é mais pão. O vinho já deixou de ser vinho. Sobre o altar há o Cordeiro imolado. Não o vemos, mas está lá, vivo e derramado em sacrifício por nós.

Como deixar de lado esse milagre de cada missa celebrada? Como trocar o corpo e sangue dado em alimento por alimentos que não trazem saciedade? Como deixar de ir à missa aos domingos? Como?

Todos comungam, o coral entoa o hino e deixamo-nos envolver pelo alimento que sacia a nossa alma. Perdão, liberdade, paz e, agora, alimento. Os anjos não comungam, pois o pão do Céu é dado aos homens e às mulheres da Terra. É para nós que o próprio Cristo se faz alimento. Aliás, os Anjos não podem nem celebrar a santa missa. Isso é próprio do ser humano. É através da mão de um homem comum que o milagre acontece.

Termina a missa. Com a bênção de Deus e com o hino de despedida, vamos saindo da igreja e voltando para nossas casas. O domingo continua o seu curso, mas, agora, com um sentido novo. Não sentimos mais a falta dos raios do sol, pois carregamos em nós uma Luz que nunca se apaga. Trazemos uma alma iluminada pela Luz do mundo. E a certeza de que ninguém poderá apagar em nós essa chama que brilha e reluz em nossos corações. Não andaremos mais nas trevas. A Luz iluminará sempre os nossos passos.