À centenária Américo de Campos

Padre Djalma Lúcio Magalhães Tuniz
Pároco de Américo de Campos e Pontes Gestal

 

“Há um tempo para cada coisa debaixo do sol”, diz o livro de Eclesiastes.

É realmente um problema querer entender o tempo. É como se quiséssemos segurar a água com as próprias mãos e, apesar de todos os esforços, ir percebendo que ela escorre entre os vãos dos dedos e vai desaparecendo, sem se importar com o nosso esforço e nem com a nossa frustação.

Cheguei à cidade de Américo de Campos, pequena porção terrena no interior do Estado de São Paulo, para ser o décimo quinto pároco empossado desde a criação da paróquia. Vim para cuidar dos sacramentos, da pastoral paroquial, da bênção aos doentes, dos aconselhamentos, das celebrações de exéquias, abençoando os fiéis defuntos e consolando as famílias. Também faz parte da minha função administrar os bens terrenos da paróquia, conservando-os e ajudando a deixar tudo organizado e em funcionamento.

O que não esperava era encontrar uma cidade centenária. Para mim foi uma surpresa quando soube que Américo de Campos estava se preparando para fazer cem anos de história de um povo que chegou nesse lugar trazendo sua força de trabalho, seus sonhos e esperanças, e, principalmente, a sua fé.

São João das Águas Paradas foi o primeiro nome que lhe deram. Aqui já percebemos que a fé católica, presente desde os primórdios, foi fundamental para construir uma comunidade sólida e próspera. Os desbravadores encontraram uma região de matas, flores, fartura de água e de animais silvestres. Dizem os historiadores que, primeiro, chegaram os desbravadores e começaram a povoar esse chão. Pouco tempo depois, chegaram os fundadores que organizaram e deram o nome a essa terra.

Se hoje, cem anos depois, temos no jardim da igreja matriz uma beleza natural deslumbrante, preservado na sua arquitetura original, graças ao esforço dos padres e do povo desta cidade, imaginemos no início quando tudo era natureza primitiva e sem a interferência das mãos humanas.

Dias desses, eu estava na porta da igreja matriz esperando o horário para iniciar a primeira missa dominical e recebendo os fiéis que chegavam, quando, de repente, um bando de maritacas apareceu fazendo uma algazarra enorme, acordando as araras-azuis que fazem morada numa palmeira imperial, começando ali um balé de pássaros e cantos que só no Paraíso devemos encontrar.

Sem contar a beleza dos ipês-rosa, que, ao se aproximar o inverno, conseguem aquecer o nosso coração com suas flores e cores. Fiz a experiência de olhar as araras-azuis debaixo de um pé de ipê florido. Com o leve soprar do vento, uma chuva de pétalas de flores rosa vai caindo e forrando a terra de cor. No céu, as araras bailavam e gritavam alto, afugentando um casal de tucanos que também queriam fazer morada no jardim da igreja. O céu, todo azul e carregado de nuvens brancas, contrastava com as cores da terra. É realmente uma beleza rara, que aqui, nesta cidade centenária e cheia de histórias, admiramos com um simples piscar de olhos.

Na entrada da cidade há um monumento dedicado ao Cristo Redentor, que com os seus braços abertos abençoa todas as pessoas que chegam e que saem. Numa das celebrações da Semana Santa deste ano, celebramos uma missa nessa praça. Era uma noite de lua clara e o céu estava cheio de nuvens. Num determinado momento, depois da bênção final, enquanto cantávamos “Jesus Cristo, eu estou aqui!”, o fotógrafo conseguiu registrar um fenômeno no céu de Américo de Campos, quando a lua ficou apenas com a claridade e as nuvens formaram como um redemoinho, emoldurando o céu, e dando-nos a certeza de que as bênçãos do nosso Deus estão sobre a nossa cidade. Um espetáculo inesquecível para os que lá estavam.

Diante de tantos tesouros que encontrei aqui, o maior de todos é a alma dessa gente. Américo de Campos chegou aos cem anos conservando em seu coração um povo honesto e trabalhador, que carrega consigo muita generosidade e muita fé. Gente acolhedora e hospitaleira, que me recebeu como um filho e tento retribuir com muito respeito e gratidão.

Aqui pude ouvir muitas histórias bonitas e também algumas tristes. Descobri que, apesar de centenária, alguns problemas da modernidade também chegaram, trazendo dor e sofrimento. Já chorei a morte de alguns de seus filhos, novos e velhos, e entre lágrimas e orações, nos unimos na esperança da vida eterna.

Participei de muitos momentos alegres e festivos. Aliás, tenho dúvidas se em nossa região há alguma cidade com um povo mais festeiro do que o nosso. Apesar de completar cem anos, continua transmitindo às novas gerações as mesmas alegrias e as mesmas motivações para festejar a vida. E como toda boa senhora de idade, o povo desta cidade tem o dom da culinária, com receitas de doces e salgados que merecem serem experimentados de joelhos, agradecendo aos céus tamanha delícia na terra.

Parabéns, Américo de Campos, pelos cem anos de existência. Agradeço a Deus por ter me trazido aqui a tempo desta comemoração. Quero compartilhar com você dessa minha alegria por agora fazer parte de uma história tão bonita e tão abençoada.

E, não posso deixar de mencionar que, neste dia em que completa o seu centenário, também festejamos o nosso Santo Padroeiro São João Batista, que desde os primeiros momentos dessa história emprestou o seu nome e cobriu de bênçãos esse povo afortunado e próspero.

Que São João Batista, o que nos apresentou o Cordeiro de Deus, Jesus, nosso Salvador, continue nos levando até o coração de Cristo. Que lá do céu, receba a nossa gratidão por todas as bênção e intercessões. Não seríamos os mesmos sem essa proteção.

Vivas a São João Batista e vivas a nossa centenária Américo de Campos!

Foto: Missa na praça do Cristo. Semana Santa de 2023. Américo de Campos/SP